


O que fortalece as nossas crianças, nossos jovens?
Quais são elementos em nossas ações pedagógicas que dialogam com a campanha da prevenção ao suicídio?
Todo mês de setembro comemoramos a chegada da primavera e, com ela o desabrochar da nossa infância interior, regando esperanças, sonhos e ideais para possíveis recomeços. Na Monte Azul comemoramos também, dentro do tradicional calendário da Pedagogia Waldorf, a festa da coragem que podemos relacionar com a “jornada do herói” de Campbell, aquele potencial em cada um de enfrentar os desafios da vida, passar pelas escuridões da existência, buscar transformações até chegar na fase de realização e celebração da trajetória concluída. Na terminologia cristã, o arcanjo Micael representa esta força que acredita e aposta em cada ser humano – podemos encontrá-lo com outros nomes nas mitologias das diversas outras culturas. Esta força apoia o indivíduo na sua diversidade singular, com seus talentos e fraquezas para que possa desenvolver autoconsciência, autoconfiança, potência individual e autonomia na busca de uma harmonia maior, de novos contextos que fortalecem uma cultura de paz e contribuam direta e/ou indiretamente na luta contra o suicídio.
O herói é uma imagem da luz e força interior de cada um que também denominamos na Antroposofia de “Eu”. Acreditamos que cada “Eu” nasce com um propósito próprio de desenvolvimento, ocupando um lugar único na humanidade. É um herói com um chamado individual, mas não é super-herói, é imperfeito, vulnerável, precisa passar por desafios diversos que causam pensamentos de dúvidas, ilusões ou morte, sentimentos de ódio, de raiva, de angústia, solidão, situações de medo e incerteza que congelam, desesperam e tiram toda a força. Por isso, por mais que seja um herói, esse ‘Eu’ necessita de apoio e proteção por um lado, e de competências e ferramentas que contribuam com o seu fortalecimento interior e resiliência por outro.
O que aconteceu com pessoas que tentam ou cometem suicídio? Será que não conseguiram se conectar suficientemente ao seu “chamado” e ter força o bastante para resistir aos desafios da vida? Quando este herói interior não teve apoio, não se sentiu visto, ouvido e reconhecido?
Nos espaços da Monte Azul cuidamos das relações, buscamos fortalecer as redes de apoio das crianças e jovens para que possam encontrar ouvidos abertos e um olhar atencioso para cada situação. Nesse intuito, contamos muitas histórias que narram situações de crise e de superação. Fazemos muitas brincadeiras que provocam confronto e posicionamento, que desenvolvem equilíbrio, agilidade e destreza física e que desafiam os sentidos. Nossas crianças devem brincar muito. Toda criança deve ter tempo e espaço para ser criança. Brincar é curativo! Também sabemos da importância de ensinar a exercitar a calma interior, tranquilizar a respiração, contemplar, refletir e avaliar. Para isso, praticamos durante todo o ano artes como “desenho de formas”, pintura com aquarela, música e canto coral, entre outros. Cultivamos o contato com a natureza, semeamos e observamos as plantas crescerem. São atividades que fortalecem e harmonizam, que ensinam a esperar e a se colocar, a ser criativo e a encontrar soluções, empoderando o indivíduo dentro do coletivo. Entendemos que desta maneira não só ajudamos a preparar as crianças e jovens para desafios e momentos difíceis da vida, como também disponibilizamos ferramentas e espaços para que eles possam descobrir seus talentos e vontades.
Durante o mês de setembro aconteceram na Monte Azul diversos encontros com vivências e reflexões para capacitação das equipes das três Nossas Cirandas (CCAs dos núcleos Monte Azul, Peinha e Horizonte Azul), relacionando o Setembro Amarelo com a tradicional festa da coragem, a arte linear de desenho de formas e a figura do herói em cada um de nós. Que o cultivo das artes e dos encontros em todas as instâncias possa cada vez mais proporcionar sentido de viver e contribuir com uma cultura de paz: na Monte Azul, no Brasil e no mundo inteiro.

Fotografias: Vivências da Festa da Coragem 1) Nossa Ciranda Horizonte Azul, 2) Nossa Ciranda Monte Azul, 3) Nossa Ciranda Peinha e 4) Capacitação das equipes dos três Nossa Ciranda.
Texto de Susanne Rotermund, Coordenadora da Escola Oficina Social e membro do Centro de Pesquisa.